Por: André Diniz
Tudo começou quando meu pai na época pioneira da vaquejada e do quarto de milha no centro de Minas Gerais, resolveu comprar dois potros. A intenção inicial era treinar os dois para vaquejada. Saiu de nossa cidade, no centro de Minas Gerais, e foi em direção ao Triângulo mineiro, mais precisamente em Uberaba, Haras Canabrava. Foi lá naquele haras que ele avistou pela primeira vez o pequeno potro ¾ quarto de milha, com grandes olhos e um estilo especial, único.
Na chegada ao haras Canabrava. Papai, foi logo escolher os potros. Eram uns 30 em um curral grande. Todos mestiços. De um lado pro outro, aquela multidão de jovens quarto de milhas esperando um dono. Naquele vai e vem de potros um pequenino, que nada tinha de tão belo, além, de grandes olhos. Papai por um motivo que até hoje não sabe, disse, quase instintivamente ao encarar por alguns minutos o pequeno Mariano, é aquele. Foi isso, colocou o pequeno Mariano e um outro potro na carroceria da camionete. E foram embora.
No sitio onde tínhamos a pista de Vaquejada Texas e alguns quarto de milhas, todos treinando vaquejada, Mariano vivia no curral. Era um potro bem atrevido e mal. Queria morder todos. Era facilitar e levar uma mordida. Eu tinha muito medo dele. As primeiras montadas ele já se mostrava diferente, não pulou, não fez nada de errado, já saiu tranqüilo.
Passou algum tempo, começou a ser treinado para correr vaquejada. E em um dia especial, o treinador chamou papai e mostrou o que eu chamo de primeiro sinal de um campeão, Mariano era o único cavalo no sítio que corria vaquejada sem o vaqueiro colocar as mãos na rédea. Algum tempo depois por motivos financeiros, papai vendeu o sitio e os cavalos, só restando o pequeno Mariano, que nesta época já não era mais pequeno. Levamos ele para a exposição da cidade.
Papai começou a treiná-lo em tambor, sem intenção alguma de ultrapassar aquele parque de exposição. De tão artesanal que era o treinamento Mariano participava de algumas provas com "professora", tipo de focinheira usada em vaquejada. Nós nem sabíamos o que era flexionar, nem nada. Contornava o tambor e as balizas de qualquer jeito. E isso ele também começou a fazer quase que sozinho. Venceu todos os cavalos da cidade, cavalos de tambor, baliza, 5 tambores. Venceu os cavalos da região, venceu os cavalos do estado, não tinha cavalo para competir com ele. Era o melhor cavalo de provas funcionais de Minas Gerais.
Lembro os prêmios que eu e papai ganhamos. Eu, um garoto de 7 anos na época , guardo até hoje uma foto preto e branco na sala de minha casa. Quem diria que aquele
olhudo iria chegar tão longe.
Hoje sou tão apaixonado por cavalos quarto de milha que posso passar 20 anos sem montar, que essa paixão não acaba. E sempre que voltar ao galope seco e eterno de um quarto de milha, tudo recomeçara.
Era um final de prova. Mariano e eu, categoria infantil no segundo tambor... eu desequilibrei, perdi as rédeas e o campeão o que fez? Continuou a prova sozinho, eu
segurava na cabeça da sela. Só consegui pegar as rédeas na linha de chegada.
Nesta época 1990, 1991, a fama de Mariano na região já era muito forte. Todos o respeitavam, como cavalo único, especial um entre um milhão. Papai e eu ganhamos muitas provas com ele, qualquer um que o montasse ganhava. Ele fazia tudo sozinho. Mariano nunca perdeu o jeito mordedor. Se facilitasse levava uma mordida.
Algum tempo depois, papai vendeu Mariano, era uma boa quantia, mas eu tenho certeza ele sempre se arrependeu disso. Era uma noite, uma senhora queria dar o cavalo de presente para filha, mais o cavalo foi mais que um presente, e um presente não só para a filha, para o marido e o filho. Deste dia em diante, pensei que o campeão estaria sepultado, engano meu. Eles entenderam a magia do cavalo, e investiram nele.
A Senhora que o comprou, passou o comando de Mariano ao marido e ao filho. O filho começou a fazer provas, ganhou na cidade, na região, no estado. A história se repetia. Levou o cavalo para São Paulo, e já nas primeiras provas, o até então desconhecido em São Paulo, passou a vencer os melhores cavalos do Brasil. Vitórias em todo o estado de São Paulo. A fama dele já tinha ultrapassado as fronteiras do estado. E eu ficava recebendo notícias de suas vitórias e pensava como aquele pequeno do curral, chegou tão longe. Em 93 ou 94 não me lembro bem, ele foi campeão brasileiro de tambor e baliza. Competiu 3 tambores em Barretos, várias vezes, ganhou carros, motos, dinheiro. O novo dono de Mariano, como eu e papai, ficou apaixonado pelo cavalo, e terá, como nós, eternamente lembranças tão emocionantes que com um pequeno artigo seria impossível descrever.
O certo é que no auge das vitórias ele foi mais uma vez vendido, me falaram que foi muito dinheiro, um dos cavalos mais caros da modalidade na época. Com o terceiro dono continuou a vencer, e eu fiquei muito tempo sem ter notícias dele. Atualmente ouvir dizer que ele está no Rio de Janeiro, e já não é o pequeno Mariano, e sim o senhor Mariano.
Quem diria, o pequeno potro que ninguém queria, chegou tão longe. Deixou marcado para sempre na minha e na lembrança de dezenas de apaixonados por quarto de milha, uma história eterna.
Parece que o tempo de glória passou, mas as histórias sobre Mariano jamais serão esquecidas. Basta uma turma de antigos amigos de provas, que conheceu Mariano se reunir, a saudade bate forte. Para mim o que difere um mito seja uma pessoa ou um cavalo de uma coisa normal é a intensidade da paz trazida pelas lembranças. E Mariano sem dúvida é um mito. Mas como a maioria dos mitos cumpre seu papel biológico, a idade chega, e algumas glórias ficam apenas nas lembranças. Mariano Jacks muito obrigado, você foi mais que um cavalo e sempre estará nas nossas melhores lembranças.
Valeu campeão!